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Excessos, discursos e ética: como medir os limites?
amonews.substack.com

Excessos, discursos e ética: como medir os limites?

Na era de múltiplas possibilidades e de democratização do conteúdo, vivemos um excesso generalizado que acaba por aumentar nossa ansiedade e reduzir nossa capacidade de escolha.

Ale Garattoni
Mar 7
11
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Excessos, discursos e ética: como medir os limites?
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O quanto você tem feito por você? Depois de dois anos neste estado permanente de estresse, tem encontrado algum escape que te lembre quem você é, do que gosta e como alimenta sua saúde mental?

Já faz algum tempo que passamos a monetizar nossos hobbies, vender TODOS os nossos conhecimentos e planejar qualquer recreio já com alguma espécie de business plan do lado. E como nos julgar por isto? Sim, estamos (quase) todos no mesmo barco de alguma forma. Sempre citado por aqui, Austin Kleon já tinha nos alertado em 2019, em seu livro Siga em Frente: "Conforme os trabalhos estáveis desaparecem, os hobbies que nos acalmavam, nos distraíam do trabalho e davam mais sentido à vida agora nos são apresentados como fontes de renda". Segundo Kleon, a forma mais fácil de odiar o que amamos é transformá-lo em trabalho.

Você também já deve ter percebido que nas outrora divertidas redes – no instagram, especialmente – pouca coisa espontânea resta. A dica de produto é sempre patrocinada pela marca, o conselho de verdade só vem depois de arrastar pra cima inscrevendo-se no curso e até o cotidiano pessoal está sempre embalado em parcerias com roteiro detalhado. Nada contra, a questão é quando o perfil (ou a rede todinha) torna-se SÓ isto e ser genuíno passa então a ser atestado de tolice ou perda de possíveis cifras. Como consumidores de conteúdo, estamos exaustos; como produtores, idem. E, sem hobbies (seja no momento da leitura ou da escrita), acabamos caindo na armadilha prevista por Austin Kleon e ficando mais estressados, mais ansiosos e sem direito a uma válvula de escape.

Voltei a ler moda & beleza por causa dela...

Muita gente aqui deve saber, mas comecei a escrever profissionalmente depois de uma especialização em jornalismo de moda: por cerca de sete anos, trabalhei para sites e revistas ligados à área, além de ter tido um blog de moda "quando blogs de moda ainda não tinham virado o que viraram os blogs de moda na mente coletiva (leia-se = estilo & fama pessoal)". Mas a verdade é que desde que saí do mercado, meu interesse por este tipo de leitura entrou em queda decrescente. Pois bem, Amy Odell acaba de reverter isto em sua (ótima) Substack-newsletter Back Row*.
* em tradução livre, Última Fila, uma clara alusão ao frenesi em torno da primeira fila dos desfiles nos últimos anos.

Colei em Amy por conta de seu ainda não lançado livro, uma biografia de Anna Wintour que estou curiosíssima para ler. Dos créditos da publicação para seu Substack foi um pulo e devo admitir que estou encantada com suas análises críticas e cheias de conteúdo. Destaque para os excessos que AINDA existem na fabricação de roupas e para a última edição, sobre a monotemática decisão de celebridades lançarem ~marcas de beleza únicas, autênticas e limpas: "Certamente não há vazio no mercado para nenhum desses produtos preencher, apesar dessas celebridades dizerem que seus produtos são projetados para fazer exatamente isso."

Amy cita também a ótima matéria do NY Times "Queridas celebridades, parem de despejar marcas de beleza", que explica como nasceu o fenômeno: desde que Kylie Jenner mostrou que com um mero post no instagram podia vender milhões de dólares em batons, muitos famosos tentam repetir a receita. Na prática, com exceção de Kylie, da Fenty (de Rihanna) e da Goop (de Gwyneth), a grande maioria das marcas não é exatamente lembrada pelos consumidores, aponta o jornal. "A mudança dos valores culturais também é um fator no declínio das marcas de celebridades. Clientes mais velhos podem ser mais atraídos por celebridades, mas é mais difícil atrair jovens da geração Z, que valorizam a autenticidade. (...) Eles não querem ser como ninguém, nem mesmo uma celebridade.”

Não seria o próprio excesso de lançamentos uma antítese do proclamado movimento pró-sustentabilidade que estas marcas defendem?

E por falar em excessos...

Nem só na moda e na beleza o pregado paradigma do "menos é mais" é traído pela realidade de excessos. Aliás, pode-se dizer que os dois anos de pico de pandemia foram marcados pela abundância de opções em todos os aspectos: informações, fontes, cursos online (!!!), posts, redes, vídeos, lives, especialistas (reais ou imaginários), formatos. E já é pra lá de sabido que tudo isto só contribui no aumento de ansiedade e consequente diminuição de saúde mental. A democratização de conteúdo, tão importante por um lado, acabou também por elevar a postos não merecidos pessoas pouco éticas.

Na última semana, uma enorme polêmica tomou conta das redes sociais: um estudante de psicologia com muitas autodenominações de peso – escritor, pesquisador, palestrante – foi desmascarado pela real autora por trás de boa parte de suas postagens sobre... masculinidade tóxica!

Sim, o suposto especialista em masculinidade tóxica se apropriava das pesquisas, aulas e livros de uma mulher sem sequer dar a ela os devidos créditos. Seguido e recomendado por nomes grandes, manteve-se ileso por tempos, pois bloqueava a psicóloga e qualquer pessoa que apontasse o plágio nos comentários de seu instagram. O mais irônico? Quando tudo veio à tona, acumulava mais de 300 mil seguidores, número ao menos quatro vezes maior que a real autora na época.

Na era dos excessos e múltiplas possibilidades, como podemos ser mais criteriosos em relação às vozes que escutamos?

Tendência "Querida, encolhi o evento"? O futuro dos cursos presenciais

Já adianto que o tópico não é fruto de pesquisas, estudos ou previsões de especialistas em futurologia: trata-se de uma mera observação mixada com desejo pessoal.

Ainda não tenho ideia de quando (nem mesmo se) voltarei aos palcos presenciais para cursos e palestras no pós-pandemia. Mas já começo a ver esta movimentação aqui e ali. E se em outros tempos aqueles seminários enormes, cheios de programação (fonte de FOMO certa!) e espaços imponentes me chamava a atenção, agora vejo um destaque importante para os cursos em formato boutique, com até 20 ou, no máximo dos máximos, 30 pessoas.

A tendência teria a ver não apenas com os tempos pandêmicos que pedem para evitar aglomeração e privilegiar o distanciamento (o que, convenhamos, é mais utópico do que real), mas principalmente com um desejo de personalização, de atenção, de acesso ao palestrante – o que é impossível nas plateias impessoais de centenas ou milhares de participantes.

O efeito vem também como consequência de dois anos em casa assistindo a milhões de cursos, aulas, workshops e lives. Queremos (ao menos muitos de nós), sim, o cara a cara do presencial. Mas também questionaremos mais para onde vale a pena o deslocamento, o horário marcado, a interação. E o evento gigantesco muitas vezes é a antítese da conexão humana, que curiosamente acontece com mais intensidade e profundidade em grupos menores.

p.s. fiquei com muita vontade de fazer um evento numa sala igualzinha a esta da foto do banco de imagens que ilustra esta notinha!

Produzir conteúdo não precisa ser "a descoberta da roda": o simples bem-feito nunca cansa!

Muitas receitas que nos são vendidas equiparam autenticidade a "fazer algo que nunca foi feito", a "descobrir o novo subnicho", a "resolver uma 'dor' do consumidor" (eu tenho pânico da história da 'dor'!). E aí a gente vai adiando, afinal, não não tem nada assim tão novo e surpreendente pra mostrar.... Mas o óbvio precisa ser dito e o recreio simples é, cada vez mais, o que procuramos.

Tenho acompanhado perfis de vendedoras de marcas que gosto e trabalham em lojas cujos espaços físicos já justificam uma dezena de stories. O que pode ser habitual para muitos é a curiosidade de tantos outros. Mostrar a loja instagramável, os looks lindos e bem montados, uma referência aqui e outra ali... e assim nasce o entretenimento genuíno que, como consumidores, temos buscado cada vez mais.

Numa das aulas do Amo Online de 2021, mostrei o caso de Alexia Nunes, que era vendedora de uma loja conhecida até que o instagram inicialmente montado como canal de comunicação com suas clientes alcançou também não clientes. Hoje, Alexia tem sua própria multimarcas online e sua curadoria e conteúdo simples e bem-feito que comunica a marca dão o tom dos frutos que colhe.

Mas a conclusão do tópico é: para construir uma marca digital nas redes, você não precisa de nada extraordinário. Seja genuíno, poste coisas bonitas e/ou interessantes, mostre seu cotidiano de maneira que ele informe e/ou inspire outros, divida o que vê, o que sabe, o que aprende de um jeito só seu. Precisamos e buscamos exatamente isto!


Para leitores da Amo News...

Posso te pedir pra me ajudar a entender como deixar esta newsletter mais redondinha e ajustada a suas preferências? São só três perguntinhas em múltipla-escolha (+ um campo opcional para dicas), é bem rápido! Como postei dias atrás no meu instagram @alegarattoni, a Amo News tem sido meu xodozinho e me lembra muito de tempos muito bons do conteúdo digital genuíno.

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Para responder a enquete, acesse este link! Obrigada!

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